domingo, 20 de maio de 2018

Os gerentes



 Quem são os homens por trás do demiurgo administrativo? Vista de baixo, a gerência não é formada de um só quem, mas de vários eles, e mesmo de coisas inanimadas. Gerência é aquilo a que se dirige um relatório em qualquer escritório, mesmo nos dos sindicatos; é uma circular impressa e um sinal no quadro de avisos; é a voz que se ouve pelos alto falantes; é um nome que se lê no jornal; é uma assinatura que não se pode decifrar, exceto se estiver escrita em baixo em letra de forma; é um sistema que dá ordens indiscutíveis a todas as pessoas que se conhecem de perto; ela projeta detalhadamente a vida profissional de um indivíduo e o âmbito de autoridade de seu chefe. Gerência á a autoridade centralizada. Vista pelo empregado médio, a gerência é formada, em parte, pelas pessoas que o cumprimentam com um sinal de cabeça, em parte por um sistema, e em parte por ele mesmo. Os colarinhos – brancos podem ser uma parte da administração, como afirmam, mas a gerência é muito mais, não é só o conjunto de seus serviços administrativos. O indivíduo exerce uma autoridade mas não é a sua fonte. Como um administrado, ele é controlado de cima, e talvez seja considerado uma ameaça; como um administrador, ele é visto de baixo, e talvez seja considerado um instrumento. Ele é, ao mesmo tempo, um dente da engrenagem e a esteira rolante da maquinaria burocrática; é um elo da cadeia de comando, persuasões, circulares e avisos que une os homens que fabricam decisões aos homens que fabricam coisas; sem ele não poderia existir o demiurgo administrativo. Mas sua autoridade está estreitamente limitada a uma órbita prescrita de ações profissionais, e o poder que ele exerce não lhe pertence. Cabe-lhe a marca do subordinado, as palavras preparadas com antecedência. O dinheiro que manuseia pertence a outro; os papeis que classifica ou despacha já trazem a marca de um dono. Ele é servidor das decisões, o assistente da autoridade, o instrumento da gerência. Está mais próximo da administração do que os operários, mas raramente lhe cabe a última palavra.
Vista do alto, a gerência é o ethos dos altos círculos: concentrar o poder em poucas mãos, mas ampliar a equipe de auxiliares. Dar aos subordinados a impressão de também participar do que eles participam. Criar cursos para gerentes e controlar o que eles aprendem; estabelecer um sistema duplo de comunicações: as ordens descem e as informações sobem. Manter um controle rígido sobre os outros, mas não os dominar, e sim às suas experiências; não deixar que eles tomem conhecimento do que não lhes é dito. Entre a decisão e a execução, entre a ordem e a obediência, só deve haver o reflexo. Ser claro, judicioso, racional, controlar a personalidade e cuidar da aparência; fazer dos negócios uma profissão. Aperfeiçoar-se. Tomar apontamentos, manter reuniões com pessoas do mesmo nível. E, em tudo isso, ser sempre igual a si mesmo e humano: cumprimentar com seriedade as funcionárias do escritório, dizer olá aos homens, e ouvir sempre atentamente os superiores: “durante o fim de semana refleti muito sobre as informações que o senhor gentilmente me forneceu na sexta-feira, sobretudo...”

Wright Mills, Charles (1916-1962)

A nova classe média. Tradução de Vera Borda, 2 edição. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976. P.100-101

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