[A balconista] velha guarda,
com pelo menos dez anos de experiência na loja, torna-se ou uma revoltada
sempre descontente, ou uma balconista inteiramente acomodada no emprego. Em
qualquer dos casos, é a espinha dorsal da equipe de vendedoras, a pedra
fundamental sobre a qual a loja se sustenta. Quando se revolta, não investe
contra si mesma ou as mercadorias, mas contra a loja: é contra seus métodos de
venda, contra o resto do pessoal, e muitas vezes lança seu rancor e sarcasmo
sobre o freguês. Muitas balconistas dizem detestar a loja e os fregueses; a
revoltada tem prazer em odiá-los e, de fato, vive desse ódio, embora esteja
pronta para defender a loja diante de um freguês. A maioria das balconistas
desse tipo é formada de mulheres mais idosas que trabalharam em todas as seções.
“Naquele tempo os fregueses eram quase todos senhoras e cavalheiros distintos,
realmente diferentes desses novos-ricos que vêm aqui diariamente vindos de
todos os cantos. Esbravejam contra a mercadoria e o serviço e eu simplesmente
ignoro-os com um olhar glacial e um rosto impassível. Não me apresso em
atendê-los. Estou farta de ouvi-los. Estou farta também de ouvir falar de
regras e regulamento; estou cansada da comida meio crua que eles nos jogam na
lanchonete após uma fila de vinte minutos, enquanto os outros não se decidem o
que vão mastigar na sua ração de meio dia. Sim, as coisas estão mudadas aqui,
mas nada é realmente novo: são sempre as mesmas velhas regras e a mesma
conversas de maneiras de vender e tipos de fregueses, conversa antiga mas com
palavras diferentes, novos ângulos, novos chefes. Todos os chefes que tive aqui
sempre me aborreceram, de modo que agora estou acostumada”. “O chefe da seção
simplesmente me detesta, mas estou aqui há tanto tempo que ele não pode fazer
nada. Enquanto meu volume de vendas continuar alto- e sempre foi muito bom-
eles só podem me criticar por coisas de menor importância. Nunca me dei bem com
os chefes, e já vi muitos delese entrar e sair do magazine. Uma hora eles
querem isso, outra aquilo, daqui a pouco é tudo diferente, sempre criticando
por uma coisa ou outra. Às vezes duvido se eles realmente acreditam no que
querem...Fico irritada com suas “novas técnicas de venda” e outra idiotices. Após
dezessete anos nessa casa não preciso de conselhos ou instrução sobre como devo
vender. Eles não me enganam: conheço o jogo deles há muitos anos [...] O senhor
pergunta: então porque fico aqui. Não tenho certeza de poder fazer outra coisa.
Levanto, tomo banho, visto-me e tomo café, arrumo minhas coisas e vou para o
Macy’s. É uma sequência quase automática; muitas vezes faço o mesmo aos
domingos e um dia fui à estação antes de cair em mim e perceber que era
domingo. Apenas um velho cavalo de aluguel atento à campainha, não passo disso.”
Wright Mills, Charles (1916-1962)
A nova classe média. Tradução de Vera Borda, 2 edição. Rio de Janeiro:
Zahar Editores, 1976. p 196
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