terça-feira, 26 de abril de 2022

O trabalho de mulheres soviéticas na Segunda Guerra Mundial

 

Cada um de nós vê a vida segundo sua atividade, segundo seu lugar na vida ou nos acontecimentos de que participa. Podemos pressupor que a enfermeira viu uma guerra, a padeira viu outra, a paraquedista uma terceira e a piloto viu uma quarta, a comandante de um pelotão de atiradores de fuzil uma quinta... Cada uma delas esteve na guerra que existia em seu raio de visão: a de uma era a mesa de cirurgia: “Vi tantos braços e pernas amputados... Já nem acreditava que em algum lugar havia um homem inteiro. Parecia que todos estavam feridos ou mortos...” (A. D., primeiro-sargento, enfermeira); de outra, os caldeirões da cozinha de campanha: “Depois de um combate às vezes não sobrava ninguém... Você cozinhava caldeirões de mingau, caldeirões de sopa, e não havia a quem dar...” (I. Z., soldado, cozinheira); a da terceira era a cabine de piloto; “Nosso acampamento ficava na floresta. Cheguei de voo e decidi entrar na floresta; já estávamos no meio do verão, os morangos estavam no ponto. Passava por uma trilha quando vi um alemão no chão... Ele já estava escuro... Me deu medo. Até aquele momento ainda não tinha visto mortos, e já combatia na guerra havia um ano. Lá no alto era diferente... Quando você está voando, só pensa em uma coisa: encontrar o alvo, bombardear e voltar. Não chegávamos a ver os mortos. Não tínhamos esse medo...” (A. B., tenente da guarda, piloto). E a guerra dos partisans até hoje está associada ao cheiro da fogueira acesa: “Fazíamos tudo na fogueira –assávamos o pão, cozinhávamos a comida; no carvão que sobrava colocávamos as camisas e as botas de feltro para secar. À noite, nos aquecíamos...”E. V.)

 

 

Svetlana Aleksiévitch (1948- )

 

 A guerra não tem rosto de mulher. Tradução de Cecília Rosas. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. p 114-5.