segunda-feira, 11 de junho de 2018

O médico e o alfaiate


O Dr. Behrens, com as pernas separadas e o tronco inclinado para trás, meteu o estetoscópio sob o braço e começou a percutir a parte superior do ombro direito de Joaquim; batia servindo-se do poderoso dedo médio da mão direita como martelo e apoiando-se na mão esquerda. Depois, desceu pelo omoplata e apalpou lateralmente a parte central e inferior das costas, feito o que Joaquim, bem amestrado, levantou o braço para que o médico pudesse explorar também a região axilar. Tudo isso se repetiu então no lado esquerdo. A seguir, o conselheiro áulico deu ordem de meia volta para examinar o peito. Percutiu a zona logo abaixo do pescoço, junto à clavícula, bateu acima e abaixo do peito, primeiro à direita e depois à esquerda. Após ter percutido suficientemente, pôs-se a auscultar, colocando o estetoscópio nas costas e no peito de Joaquim e apertando a orelha contra a concha; dessa forma foi percorrendo todas as regiões anteriormente apalpadas. Ao mesmo tempo era preciso que Joaquim ora respirasse com vigor ora tossisse artificialmente, o que parecia fatigá-lo muito, pois ofegava e seus olhos enchiam-se de lágrimas. O Dr. Behrens, porém, comunicava tudo o que ouvia ao assistente sentado à escrivaninha, de modo que Hans Castorp não pode deixar de pensar numa sessão no alfaiate, quando o elegante artífice toma as medidas para um traje e, numa ordem tradicional vai colocando a fita métrica aqui e ali em volta do corpo e dos membros do freguês, para então ditar as cifras assim obtidas ao oficial que de costas encurvadas se empenha em anotá-las. "Sopróide", "diminuído", ditava o Dr Behrebs. "Vesicular", dizia e outra vez "vesicular"- parecia que isso era bom sinal. "Rude" continuava, fazendo uma careta. "Muito rude". "Estalido". E o Dr. Krokovski ia tomando nota, como um aprendiz faz com os centímetros ditados pelo cortador.

Thomas Mann (1875-1955)


A montanha mágica. 8 edição. Tradução de Herbert Caro.Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1980. p 201.

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