Vejo muito bem que não faço nada de
extraordinariamente importante quando me sento à secretária na repartição e me
ponho a copiar minutas. E, no entanto, sinto-me vaidoso: trabalho, faço
qualquer coisa de útil e faço-o pelo meu próprio esforço. E, além disso, há
alguma coisa de mal no fato de eu não fazer outra coisa senão copiar? É
porventura algum pecado? Ora! Não passo de um amanuense! Mas vamos lá a ver: que
tem isso de desonroso? A minha letra é perfeitamente clara, legível, tanto que
até parece letra de imprensa, e dá gosto ver uma página escrita por mim...Sua
Excelência, o ministro, está muito satisfeito comigo. Quer sempre que seja eu
quem lhe copie os documentos que levam a sua assinatura. Ora, tudo isto está
muito bem; o que é pena é eu não redigir com elegância. De sobejo sei que não
tenho estilo, que não domino a construção da prosa. Também sei isso
perfeitamente e essa foi a razão por que eu não pude subir no emprego...
Sei tudo isto lindamente; mas, afinal, se
todas as pessoas escrevessem de maneira original, diga-me, quem diabo havia de
copiar as minutas?
Dostoievski,
Fiodor M. (1821-1881)
Pobre
gente. Obra completa em quatro volumes. Tradução de Natália Nunes. Rio de Janeiro:
Aguilar Editora,1963. V 1.
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