terça-feira, 16 de outubro de 2018

Engenho

Ficava a fábrica bem perto da casa grande. Um enorme edifício de telhado baixo, com quatro biqueiras e em bueiro branco, a boca cortada em diagonal. Não sei porque os meninos gostam tanto das máquinas. Minha atenção inteira foi para o mecanismo do engenho. Não reparei mais em nada. Voltei-me inteiro para a máquina, para as duas bolas giratórias do regulador. Depois comecei a ver os picadeiros atulhados de feixes de cana, o pessoal da casa das caldeiras. Tio Juca começou a me mostrar como se fazia o açúcar. O Mestre Cândido com uma cuia de água de cal deitando nas tachas e as tachas fervendo, o cocho com o caldo frio e uma fumaça cheirosa entrando pela boca da gente.
-É aqui onde se cozinha o açúcar. Vamos agora para a casa de purgar.
Dois homens levavam caçambas com mel batido para as formas estendidas em andaimes com furos. Ali mandava o purgador, um preto, com as mãos metidas na lama suja que cobria a boca das fôrmas. Meu tio explicava como aquele barro preto fazia o açúcar branco. E os tanques de mel de furo, com sapos ressequidos por cima de uma borra amarela, me deixaram uma impressão de nojo.

                        Lins do Rego, José (1901-1957)



                        Menino de engenho. 47 edição. Rio de Janeiro: José Olympio, 1991. p. 12-13

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