Coletânea de excertos sobre as várias faces do trabalho, escolhidos a partir de muitas e prazerosas leituras de textos literários e afins (com algumas ilustrações)
sábado, 27 de outubro de 2018
O amanuense
Meu trabalho é um modo de existência
Federico Fellini (1920-1993)
O atestado médico de 1446: o moedeiro enfermo dos peitos
domingo, 21 de outubro de 2018
Preconceitos patronais
Ford, Henry (1863-1947)
quarta-feira, 17 de outubro de 2018
O aproveitamento dos inválidos
Ford,
Henry (1863-1947)
terça-feira, 16 de outubro de 2018
O operário no mar
Engenho
Lins do Rego,
José (1901-1957)
domingo, 14 de outubro de 2018
O poeta e o mundo: discurso do Nobel de 1996.
[...] inspiration is not the exclusive privilege of poets or artists generally. There is, has been, and will always be a certain group of people whom inspiration visits. It’s made up of all those who’ve consciously chosen their calling and do their job with love and imagination. It may include doctors, teachers, gardeners – and I could list a hundred more professions. Their work becomes one continuous adventure as long as they manage to keep discovering new challenges in it. Difficulties and setbacks never quell their curiosity. A swarm of new questions emerges from every problem they solve. Whatever inspiration is, it’s born from a continuous “I don’t know.”
There aren’t many such people. Most of the earth’s inhabitants work to get by. They work because they have to. They didn’t pick this or that kind of job out of passion; the circumstances of their lives did the choosing for them. Loveless work, boring work, work valued only because others haven’t got even that much, however loveless and boring – this is one of the harshest human miseries. And there’s no sign that coming centuries will produce any changes for the better as far as this goes.
And so, though I may deny poets their monopoly on inspiration, I still place them in a select group of Fortune’s darlings.
At this point, though, certain doubts may arise in my audience. All sorts of torturers, dictators, fanatics, and demagogues struggling for power by way of a few loudly shouted slogans also enjoy their jobs, and they too perform their duties with inventive fervor. Well, yes, but they “know.” They know, and whatever they know is enough for them once and for all. They don’t want to find out about anything else, since that might diminish their arguments’ force. And any knowledge that doesn’t lead to new questions quickly dies out: it fails to maintain the temperature required for sustaining life. In the most extreme cases, cases well known from ancient and modern history, it even poses a lethal threat to society.
This is why I value that little phrase “I don’t know” so highly. It’s small, but it flies on mighty wings. It expands our lives to include the spaces within us as well as those outer expanses in which our tiny Earth hangs suspended. If Isaac Newton had never said to himself “I don’t know,” the apples in his little orchard might have dropped to the ground like hailstones and at best he would have stooped to pick them up and gobble them with gusto. Had my compatriot Marie Sklodowska-Curie never said to herself “I don’t know”, she probably would have wound up teaching chemistry at some private high school for young ladies from good families, and would have ended her days performing this otherwise perfectly respectable job. But she kept on saying “I don’t know,” and these words led her, not just once but twice, to Stockholm, where restless, questing spirits are occasionally rewarded with the Nobel Prize.
Poets, if they’re genuine, must also keep repeating “I don’t know.” Each poem marks an effort to answer this statement, but as soon as the final period hits the page, the poet begins to hesitate, starts to realize that this particular answer was pure makeshift that’s absolutely inadequate to boot. So the poets keep on trying, and sooner or later the consecutive results of their self-dissatisfaction are clipped together with a giant paperclip by literary historians and called their “oeuvre” …
Três perguntas
- Como é possível que
operários cujos avós precisavam quase ser espancados para ir ao trabalho
na segunda-feira suportam hoje uma greve de fome de cem dias de duração
para conservar um empreguinho miserável?
- Como é possível
que o trabalho tenha se transformado no único registro de organização
social? E como se explica que o trabalho não dispõe mais de nenhuma instância
contrária que possa ser levada a sério?
- Como se explica
que uma sociedade que apostou tudo, mas tudo mesmo, na carta trabalho,
agora se veja obrigada a rasgar esta única carta, a única carta do seu
jogo, e assim fazer com que o trabalho e, por conseguinte, a identidade
sejam desvalorizados?
sexta-feira, 12 de outubro de 2018
A parábola de Saint-Simon
O trabalho é uma atividade forçada
Wallon, Henri (1879-1962)
quarta-feira, 10 de outubro de 2018
A aventura de um esposo e uma esposa
quinta-feira, 4 de outubro de 2018
Construção
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado
Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague.