Consideremos agora outras metáforas
estruturais que são importantes em nossas vidas: O TRABALHO É UM RECURSO e O
TEMPO É UM RECURSO. Ambas se baseiam culturalmente em nossa experiência com
recursos materiais. Os recursos materiais são, caracteristicamente, matérias-primas
ou fontes de energia. Considera-se que ambos servem a determinados fins.
Pode-se usar os combustíveis para calefação, transportes ou como fontes de energia
para a manufatura de um produto final. As matérias-primas se transformam
diretamente em produtos. Em ambos os casos, se pode quantificar os recursos
materiais e a eles atribuir um valor. Nos dois casos, o que é importante para
cumprir o propósito concreto é o tipo de material que se opõe à parte ou
quantidade particular. Por exemplo, não importa quantos pedaços de carvão
aqueçam a casa de alguém, desde que sejam do tipo de carvão adequado. Nos dois
casos, o material se consome progressivamente, conforme vá cumprindo seu
objetivo. Em resumo:
Um recurso material
é um tipo de substância
se pode quantificar com bastante precisão
se pode lhe atribuir
um valor pela quantidade em cada
unidade
serve a um
determinado propósito
se vai consumindo progressivamente conforme
serve a esse propósito.
Tomemos um caso simples, no qual alguém
fabrica um produto a partir de uma matéria-prima. Efetua uma certa quantidade
de trabalho. Em geral, quanto mais trabalho se realiza mais produtos acabados
se obtém. Assumindo que isto seja correto, -que o trabalho é proporcional à
quantidade de produto- podemos atribuir um valor
ao trabalho em termos do tempo que custa produzir uma unidade do produto. O
modelo perfeito é a linha de montagem onde a matéria-prima entra por um
extremo, se realiza trabalho em etapas progressivas, cuja duração se fixa
segundo a velocidade da própria linha, e o produto sai pelo outro extremo. Isto
proporciona uma base para a metáfora O TRABALHO É UM RECURSO da seguinte forma:
O TRABALHO é um tipo de atividade (lembre-se:
UMA ATIVIDADE É UMA SUBSTÂNCIA)
se pode quantificar com bastante precisão (em
termos de tempo)
se pode lhe atribuir
um valor por unidade
serve a um fim determinado
se consome progressivamente conforme serve
a esse propósito
Uma vez que se pode quantificar o trabalho em
termos de tempo, e normalmente ele é assim quantificado, em uma sociedade
industrial temos as bases da metáfora O TEMPO É UM RECURSO:
O TEMPO é um tipo de substância (abstrata)
se pode quantificar com bastante precisão
se pode lhe atribuir
um valor por unidade
serve a um fim determinado
se consome progressivamente conforme serve
a esse propósito
Quando vivemos das metáforas O TRABALHO É UM
RECURSO e O TEMPO É UM RECURSO, como ocorre em nossa cultura, tendemos a não
vê-las como metáforas. Porém, como mostra nossa explicação de sua base na
experiência, as duas são metáforas estruturais básicas nas sociedades
industriais ocidentais.
Essas duas metáforas estruturais complexas
usam metáforas ontológicas simples. O TRABALHO É UM RECURSO utiliza UMA
ATIVIDADE É UMA SUBSTÂNCIA. O TEMPO É UM RECURSO utiliza O TEMPO É UMA
SUBSTÂNCIA. Estas duas metáforas de SUBSTÂNCIA permitem quantificar o trabalho e
o tempo, isto é, medi-los, concebê-los como algo que se consome
progressivamente e atribuir-lhes valores monetários; também nos permitem ver o
tempo e o trabalho como coisas que podem ser usadas para diversos fins.
Mas, O TRABALHO É UM RECURSO e O TEMPO É UM
RECURSO não são universais, sob nenhum pretexto. Emergiram de maneira natural
em nossa cultura devido à maneira pela qual vemos o trabalho, nossa paixão pela
quantificação e nossa obsessão por cumprir propósitos. As duas metáforas
destacam aqueles aspectos do trabalho e do tempo que são centralmente
importantes em nossa cultura. Ao fazê-lo, também desenfatizam ou ocultam certos
aspectos do trabalho e do tempo. Podemos ver o que ocultam examinando em que coisas
se concentram.
Ao considerar o trabalho como um tipo de atividade, a metáfora assume que
se pode identificar claramente o trabalho e se pode distingui-lo de coisas que
não são trabalho. Assume-se que podemos diferenciar o trabalho do jogo e a
atividade produtiva da não produtiva. Estas suposições, obviamente não se
ajustam à realidade em numerosos casos, com exceção talvez do caso das linhas
de montagem, trabalho forçado, etc. Considerar o trabalho meramente como um tipo de atividade, independente de quem
o realiza, como o experimenta e o que significa em sua vida, encobre a questão
de se o trabalho é significativo de maneira pessoal, satisfatória e humana.
A quantificação do trabalho em termos de
tempo, junto à visão de tempo como algo que serve a determinados fins, induz a
noção de tempo livre, que é paralela à noção de tempo de trabalho. Em uma
sociedade como a nossa, na qual não se considera a inatividade como um fim em
si mesmo, se desenvolveu uma indústria totalmente dedicada à cultura do tempo
livre. Como resultado, o tempo livre também se converte em um recurso, que se
deve gastar de uma maneira produtiva, utilizar com sabedoria, economizar, que
se pode desperdiçar, perder, etc. O que fica oculto nas metáforas de RECURSO
quando se aplicam ao trabalho e ao tempo é a forma pela qual nossos conceitos
de trabalho e tempo afetam nosso conceito de ócio, convertendo-o em algo
incrivelmente parecido ao trabalho.
As metáforas de RECURSO aplicadas ao trabalho
e ao tempo ocultam todo tipo de concepções de trabalho e de tempo que existem
em outras culturas e em algumas subculturas de nossa própria sociedade: a ideia
de que o trabalho pode ser um jogo, que a inatividade pode ser produtiva, de
que muito do que chamamos de trabalho ou não serve a um efeito claro ou não tem
nenhuma utilidade.
Lakoff, George (1941- ) e Johnson,
Mark (1949- )
Metáforas de la vida cotidiana.
Traducción de Carmen González Marín. Madrid: Ediciones Cátedra, 1991. p 105-108
(tradução minha)
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