E eu, o que eu fazia...? Eu era o patrão. Sentava-me
em meu lugar como um guarda-noturno. Tratava de ser respeitoso, humano, justo. Ao
mesmo tempo tratava também, naturalmente, de receber da fábrica e dos
empregados tudo a que eu tinha direito em termos de lucros e vantagens.
Observava com muita pontualidade minha disciplina de trabalho na fábrica, com
mais pontualidade que os empregados e funcionários do escritório. Assim me
esforçava por servir à fortuna e à receita destinada a mim. Porém por dentro
tudo era assustadoramente vazio...O que eu podia fazer na fábrica? Aceitava ou
rejeitava um projeto, implantava uma nova organização do trabalho, buscava
novos mercados para a produção. E a grande receita me dava alegria?...Alegria não
é a palavra apropriada. Eu me satisfazia por poder cumprir as obrigações
perante o mundo, o dinheiro possibilitava que eu não tivesse um partido político
de uma forma honesta, digna, generosa e responsável. No mundo dos negócios eu
era citado como exemplo de homem de negócios pontual. Sabia ser respeitoso,
conseguia prover de pão, e mais que pão, muita gente... É bom poder dar. Eu
apenas não alcançava uma alegria verdadeira. Vivia com conforto, meus dias
passavam com honestidade. Não era inativo, ao menos aos olhos do mundo não era
inútil, nem preguiçoso. Eu era o bom patrão: assim as pessoas falavam de mim
também na fábrica. Entretanto isso tudo não me dava nada, era apenas um modo
sofrido, preocupante, responsável de passar o tempo.
Márai, Sandor (1900 -1989)
De verdade. Tradução de Paulo Schiller. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008. p 206-207.
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