Mas essa limpeza não é feita de qualquer
jeito, só para se livrar da sujeira, usando detergente ou até alguns aparelhos.
Todas as disciplinas tradicionais têm um estilo particular de limpar o chão, em
que se usa água fria com panos de algodão, ficando-se num estado desperto de
consciência e solicitando do corpo uma posição específica. O pano deve ser
umedecido em água fria (sem detergente) e depois torcido. Abre-se o pano úmido no
chão, pondo-se as duas palmas das mãos sobre ele. Os joelhos não tocam o chão,
somente as mãos e os pés. De modo que o corpo fica parecido a um V invertido.
Então andamos para a frente, lentamente, empurrando o pano pelo chão.
Normalmente começamos por um lado do ambiente e atravessamos sem parar em direção
ao outro. Quando chegamos na parede oposta, ficamos em pé, umedecemos o pano e
recomeçamos por uma outra “pista”. Nesta posição, nossos quadris estão firmes,
e trabalhamos o corpo à medida em que limpamos o chão. Enquanto fazemos esse
exercício, temos de pensar somente em esfregar o pano, limpando cuidadosamente.
Não devemos nos apressar, ficar distraídos ou pensar em outras coisas. Não
devemos conversar com outro colega. Tudo isso é extremamente difícil, mas é algo
muito bom para treinar a concentração de que um ator necessita.
Existe um conceito que se encontra na antiga filosofia
budista indiana, o samadhi, que se
refere a um nível particular de concentração profunda. De certo modo, é
extremamente simples: quando lemos um livro, apenas nos concentramos na leitura
do livro; quando pescamos, focamos nossa atenção somente nos movimentos e na
vibração da própria linha; quando limpamos o chão, é tudo o que fazemos. [...] É
extremamente difícil concentrar-se apenas na ação de limpar: é fácil
distrair-se. No entanto, os atores devem ser capazes de realizar qualquer
atividade com 100% de si mesmos e de concentração.
Yoshi Oida ( 1933- )
O ator invisível. Prefácio de Peter
Brook; tradução de Marcelo Gomes. São Paulo: Via Lettera, 2007. p 22-23.
Yoshi Oida em O homem que... |
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