quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

A engenheira de pontes

 

Já mencionei que minha profissão era de engenheira especializada em projetos de pontes? Construí pontes na Síria e na Líbia, e também na Polônia, perto de Elblag, e duas em Podláquia. Aquela ponte na Síria era estranha – ligava as margens de um rio que aparecia apenas sazonalmente -, a água fluía no leito por dois ou três meses, depois a terra quente a absorvia e o leito se transformava em algo como uma pista de bobsled por onde corriam cães selvagens do deserto.

O que me dava mais prazer era transformar uma ideia em números - deles surgia uma imagem concreta, depois um esboço, e então um projeto. Os números juntavam-se em minha folha de papel e lá se ajeitavam de uma forma compreensível. Gostava muito daquilo. Meu talento em álgebra foi útil na época em que era preciso fazer todas as contas com uma régua de cálculo para elaborar um mapa astral. Hoje em dia é desnecessário; há programas de computador só para isso. Quem ainda se lembraria da régua quando o remédio para qualquer sede de conhecimento está apenas a um clique?

 

 

Olga Tokarczuk (1962-)

 

 

Sobre os ossos dos mortos. Tradução de Olga Baginska-Shinzato. São Paulo: Todavia, 2019. p 108.

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