quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Supridores de supermercado

[...] Naquele momento, não se sentia inferior, como sempre acabava acontecendo na rotina estafante do supermercado, em cujo depósito se matava desmontando as montanhas de caixas, pacotes e fardos, para catar os produtos que estivessem acabando nas prateleiras, para depois tornar a montar as montanhas de caixas, pacotes e fardos, para em seguida ir colocar os produtos em seus respectivos lugares nas prateleiras, para que então os clientes viessem e comodamente os pegassem e os jogassem nos carrinhos de compras, sem imaginar a enorme quantidade de suor derramado, a enorme quantidade de energia gasta para que tudo estivesse ali, à mão, e sem imaginar, muito menos, que a remuneração obscena correspondente àquele trabalho todo não supria muitas vezes as necessidades mais básicas de um ser humano, mas sempre prontos a enchê-los dos mais baixos desaforos se uma única etiqueta de preço estivesse fora do lugar, se um único produto estivesse em falta, ao que ele só podia baixar a cabeça, porque, afinal, o cliente tinha sempre razão.

 

 

José Falero (1987-)


Os supridores. São Paulo: Todavia, 2020, p 134

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