As fábricas de estruturas metálicas e caldeiraria,
como outras, devido às concorrências, têm épocas com excesso de trabalho e
outras em que o serviço praticamente para, às vezes dois ou mais meses. É a falta
de planejamento do sistema capitalista ou a saturação dos mercados, ou então a
livre concorrência em que o mais forte engole o mais fraco, papel que no caso
fica com a fábrica parada. Esta é a época de dispensar um bom número de operários.
Quando o serviço normalizar, outros serão admitidos com salário menor. E quando
tiver excesso de trabalho, todo o mundo trabalhará até as 20 ou 22 horas. E
muitos serão “convidados” a trabalhar a noite toda, durante semanas ou meses.
As horas noturnas correm lentas, arrastadas,
não contadas pelo sol, mas pela escuridão. O trabalho noturno consome os nervos
do trabalhador. Os raios de luz da solda se tornam tão brilhantes como os de um
sol em miniatura e castigam os olhos dos outros operários. Os soldadores se
espalham pela fábrica de maneira que o montador e os outros soldadores se sentem
perseguidos pelos raios de luz. São oito horas, muitas vezes dez ou doze, que
parecem a eternidade. É como se o relógio parasse e o tempo se tornasse fixo
como as estrelas. O montador risca as chapas de ferro, mas os reflexos, as
luzes e as sombras não permitem enxergar os riscos. Os raios intensos de solda
queimam as vistas. O operário vira-se de costas, mas outro eletrodo se acende
em um outro ponto e ele se encontra cercado por raios de pequenos sóis. As
horas passam lentas, o friozinho da madrugada penetra o corpo sonolento e o
tempo continua parado até o céu negro começar a clarear. Às sete horas, outros começam
o trabalho normal e o que trabalhou à noite está largando para chegar em casa às
oito ou oito e meia, comer alguma coisa e deitar para dormir um sono esquisito,
quando tudo é vida e movimento na casa e na rua. Às três e meia da tarde acorda,
almoça, senta na porta da casa vendo o sol declinar e se prepara para outra
noite de trabalho.
Vida estranha a de quem trabalha à noite. Vida
angustiante de quem não faz outra coisa senão trabalhar, comer e dormir. Não há
tempo para mais nada. Dificilmente alguém se acostuma a esta vida, mas é fácil
ficar com os nervos abalados.
Ignácio Hernandez (1932- )
Memória operária, Cidade Industrial Contagem
(BH) 1968-1978. Belo Horizonte: Vega, 1979, pp 45-46.
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